Tuesday, 29 July 2025

O Estado da Nação explicado de forma simples – Três cenas do quotidiano que dizem muito.

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 Estas três situações – cortes de eletricidade, transportes inter-ilhas deficiente, e insegurança incontrolada – são suficientes para traçar um primeiro balanço do Estado da Nação. Lembram-nos que o desenvolvimento não se mede apenas em indicadores económicos como o PIB e outros rankings internacionais, que alias, as autoridades apreciam e gostam de ostentar.

Por Alexandre Fontes

 

 Nem sempre é necessário consultar relatórios ou ouvir discursos solenes para entender o estado real de um país. Às vezes, um simples dia ordinário, contado com honestidade, é suficiente para traçar um retrato muito mais eloquente do que números. Aqui estão três situações vividas, que dizem muito sobre as dificuldades atuais em Cabo Verde – em termos de eletricidade, transporte inter-ilhas e segurança interna.

  1. Quando a luz se apaga, a economia pára.

Ainda ontem, numa simples tentativa de comprar pão, deparamos com uma situaçao de falha. A padaria de Achada Santo-Antão (perto do antigo Di Nos) não tinha nada para vender – não por falta de farinha ou de água, mas por falta de eletricidade. Mesmo problema nas novas lojas, especializadas na venda de água filtrada: por falta de eletricidade, nao havia  serviço.

Pensando em ganhar tempo de forma útil, uma tentativa de visita ao barbeiro terminou em mais um fracasso. Este último, exasperado, praguejava contra a Electra ou EDEC (ou uma das suas múltiplas designações recentes): "num dia, mal dois cortes de cabelo, e ainda assim! Para o último cliente, estive prestes a deixá-lo com metade da cabeça rapada", brinca amargamente.

Para além da anedota, esta realidade quotidiana revela uma verdade inquietante: a economia local, seja formal ou informal, depende inteiramente de um serviço de eletricidade deficiente. Uma situação indigna de um país que se orgulhou ha pouco, da sua promoção à categoria de Países de Rendimentos Médios Alto.

  1. Viajar no seu próprio país, um percurso do combatente

Um familiar que vive nos Estados Unidos voltou recentemente para passar alguns dias de férias no seu país natal. O seu projeto era simples: visitar os pais na Brava, passar quatro dias com eles, voltar a Santiago e, em seguida, explorar uma outra ilha antes de regressar aos EUA. Mas três dias após a sua chegada à Praia, ele ainda estava à espera de um barco para ir à Brava.

Já tinha excluido as ilhas de Maio e de São Nicolau dos seus planos, alertado por outros viajantes sobre a imprevisibilidade do transporte para essas ilhas. Mas perante tantas incertezas, ele acabou por abandonar a ideia de descobrir uma outra ilha. Mais grave ainda, ele teme agora não conseguir voltar a tempo da Brava para apanhar o seu voo para os Estados Unidos.

Inclusivo, teve dificuldade em acreditar, dada a sua jovem idade, que, numa época não muito distante, havia voos diretos e regulares entre Praia e Boston – e ainda menos de Praia para o Brasil realizados pela companhia aérea nacional. E no entanto...

Esta narrativa ilustra uma outra faceta preocupante da vida insular atual em Cabo Verde: a falta de fiabilidade e de regularidade dos transportes inter-ilhas, que limita tanto a mobilidade dos cidadãos como o desenvolvimento do turismo e condiciona o dinamismo económico.

  1. Insegurança: o silêncio das midias do Estado contra os factos

O conselho que muitos cabo-verdianos não gostariam de dar aos seus amigos ou turistas que visitam o nosso país, mas não entanto se sentam obrigados: "Tenham cuidado quando saírem e evitem as ruas desertas após o cair da noite". Não é um excesso de prudência, é um reflexo de sobrevivência, mas é pesado para qualquer cabo-verdiano que acreditou e ainda acredita neste país.

O paradoxo é que a televisão pública e os meios de comunicação estatais continuam a silenciar os assaltos, as violências e agressões, preferindo preservar a ilusão de uma criminalidade em diminuição – uma posição bem conveniente para não contradizer o discurso e as estatísticas oficiais. Contudo, as redes sociais, essas não mentem. Os factos são partilhados, os testemunhos abundam, as feridas e traumas permanecem.

Um balanço em três imagens

Estas três situações – cortes de eletricidade, transportes inter-ilhas deficiente, e insegurança incontrolada – são suficientes para traçar um primeiro balanço do Estado da Nação. Lembram-nos que o desenvolvimento não se mede apenas em indicadores económicos como o PIB e outros rankings internacionais, que alias, as autoridades apreciam e gostam de ostentar.

O progresso e a consequente melhoria da qualidade de vida devem ser sentidos no dia-a-dia dos cidadãos, na estabilidade da sua vida, na sua capacidade de se deslocar, de trabalhar, de viver em segurança. Nunca deve ser feito à custa das conquistas sociais, nem contentar-se com promessas vazias.

Ainda é tempo de retificar a situaçao economica e social no país. Não através de discursos, mas por ações concretas, à altura dos desafios que os cabo-verdianos enfrentam no quotidiano.

No final, no que diz respeito ao progresso social que deve refletir o estado da Nação, o estado real, poderíamos simplesmente olhar para um outro indicador que, aliás, está ao alcance de todos, a emigração dos cabo-verdianos para o exterior. De fato, esse indicador sempre refletiu as condições de vida num país e a esperança dos jovens num futuro mais próspero.

Texto escrito após uma falta de eletricidade e que me obrigou a redigir com uma caneta e transcrito no computador em formato digital, quando luz dja bem.

 

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Colunistas

Opiniões e Feedback

Isa
11 hours 14 minutes

Isto do 15/o salário é ANEDOTA . Ninguém quer perder eleições

jcf
1 day 6 hours

É mesmo isso, se prestarmos atenção com olhos bem abertos — e não com aquela lente cor-de-rosa da diplomacia vaticana ...

Semedo
2 days 8 hours

O excedente que pode levar a mais um bonus * 15/o salario !!!) deve ser encaminhado para Instituições de Carentes. Tanta ...

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