As causas da emigração africana são, por conseguinte, múltiplas e profundamente enraizadas nas questões económicas, sociais e políticas. O desemprego crónico, a falta de oportunidades educativas e profissionais, e os conflitos armados empurram diariamente milhares de jovens a aventurarem-se em terras estrangeiras, na esperança de encontrar uma vida melhor. A busca pelo “sonho europeu” ou americano tornou-se uma obsessão para muitos, mesmo que o caminho para lá chegar seja repleto de perigos. Clandestinidade, travessias mortíferas pelo Mediterrâneo, ou a perigosa travessia do deserto do Saara são apenas alguns dos obstáculos que os jovens enfrentam, muitas vezes com um resultado trágico.
Por José Mendonça Monteiro*
A emigração dos jovens africanos, legal ou clandestinamente, tem vindo a moldar o presente e a antecipar consequências profundas para o futuro de África. Este fenómeno migratório, motivado por um conjunto de fatores complexos e interligados, é tanto uma resposta às crises internas dos países africanos como um reflexo de uma realidade mundial que se encontra em constante transformação. A história de emigração de África para o resto do mundo é um eco das desigualdades que têm marcado a relação do continente com a Europa e outras potências.
O que está na base da pobreza em África, quando comparada com a Europa e o resto do mundo, não pode ser dissociado das marcas deixadas pelo colonialismo e pela exploração contínua das suas riquezas naturais. África, sendo um dos continentes mais ricos em recursos naturais, sempre foi alvo de interesses externos que, em vez de promoverem o desenvolvimento autossustentado, serviram para enriquecer outros. O ouro, o petróleo, os diamantes, o cacau, entre outros bens de primeira linha, alimentaram economias europeias e mundiais, deixando a África dependente e empobrecida. Sem uma infraestrutura capaz de transformar essas matérias-primas localmente, o continente tornou-se refém de importações, num ciclo vicioso que perpetua a dependência e a pobreza.
As causas da emigração africana são, por conseguinte, múltiplas e profundamente enraizadas nas questões económicas, sociais e políticas. O desemprego crónico, a falta de oportunidades educativas e profissionais, e os conflitos armados empurram diariamente milhares de jovens a aventurarem-se em terras estrangeiras, na esperança de encontrar uma vida melhor. A busca pelo “sonho europeu” ou americano tornou-se uma obsessão para muitos, mesmo que o caminho para lá chegar seja repleto de perigos. Clandestinidade, travessias mortíferas pelo Mediterrâneo, ou a perigosa travessia do deserto do Saara são apenas alguns dos obstáculos que os jovens enfrentam, muitas vezes com um resultado trágico.
Todavia, as consequências dessas migrações são tanto negativas quanto positivas, tanto para os países de origem como para os de destino. A nível negativo, África enfrenta a chamada “fuga de cérebros”, uma perda contínua de quadros qualificados que, em vez de contribuírem para o desenvolvimento do seu país, procuram oportunidades no exterior. A falta de quadros técnicos para potencializar e transformar as matérias-primas localmente é uma das principais razões pela qual o continente se mantém refém de potências estrangeiras. As indústrias locais não têm capacidade para competir globalmente, pois as suas melhores mentes estão fora, servindo economias que já são avançadas.
Por outro lado, a diáspora africana tem, em muitos casos, gerado remessas de dinheiro fundamentais para o sustento das famílias e para pequenas economias locais. Além disso, os emigrantes que conseguem integrar-se nos mercados de trabalho dos países de acolhimento muitas vezes regressam, ou mantêm fortes laços com as suas origens, trazendo consigo novas competências, experiências e conhecimentos que podem ser fundamentais para o desenvolvimento dos seus países de origem. A construção de uma ponte sólida entre a diáspora e África é, por isso, uma estratégia essencial que os governos africanos devem continuar a promover. Uma política que incentive o retorno desses emigrantes, com o propósito de reverter a “fuga de cérebros”, poderia dar novo alento à economia e à sociedade africana.
É também importante mencionar o papel da demografia neste contexto. A Europa e muitos países desenvolvidos enfrentam uma crise demográfica, com uma população envelhecida e uma taxa de natalidade insuficiente para assegurar a renovação geracional. Neste sentido, a migração africana tem um potencial positivo ao contribuir para a correção desse défice demográfico. Os jovens africanos e os seus descendentes podem ser a resposta para preencher lacunas laborais e, a longo prazo, ajudar a equilibrar as pirâmides etárias. Contudo, para que este cenário seja positivo para ambas as partes, é necessário que haja uma integração adequada dos migrantes, com políticas de inclusão social e laboral nos países de destino.
Cabo Verde, uma nação insular com uma longa tradição de emigração, enfrenta desafios semelhantes, mas num contexto específico. O excesso de jovens qualificados e a falta de oportunidades de emprego criam um clima de desespero entre a população jovem. O sistema educativo cabo-verdiano tem gerado uma nova geração de quadros com formação superior, mas a economia do país ainda não é capaz de absorver toda essa mão-de-obra qualificada. O Estado de Cabo Verde tem procurado incentivar estes jovens a continuar os seus estudos na Europa e em outros lugares, apostando na ideia de que, tal como no futebol, os jovens “emprestados” para o estrangeiro possam, um dia, regressar com experiência e conhecimentos que beneficiem o país.
Essa política assemelha-se à prática desportiva de emprestar jogadores a clubes de maior visibilidade, na esperança de que se desenvolvam e, mais tarde, regressem com mais capacidades. No entanto, tal como no futebol, há sempre o risco de que esses jovens talentos sejam “comprados” pelos países de acolhimento e que nunca regressem. Cabo Verde, tal como muitos países africanos, deve, portanto, trabalhar na criação de um ambiente atrativo para o retorno destes quadros, oferecendo condições de trabalho e de vida que façam valer a pena voltar ao país de origem.
O papel da política cabo-verdiana neste cenário é vital. Incentivar os jovens a emigrar para estudar e trabalhar no exterior deve ser acompanhado de políticas internas que criem as condições para o seu regresso. Isso implica apostar em setores estratégicos, onde os conhecimentos adquiridos no estrangeiro possam ser aplicados localmente, transformando o país num espaço mais competitivo. A analogia com o futebol é clara: é preciso garantir que os jogadores emprestados regressam à casa, trazendo consigo vitórias e novas capacidades que fortaleçam a equipa.
O êxodo africano não é um fenómeno isolado nem recente, mas o seu impacto nas próximas décadas será decisivo para o futuro de África. As consequências, tanto positivas quanto negativas, dependem da capacidade dos estados africanos de adotarem políticas que não só controlem os fluxos migratórios, mas que também utilizem a diáspora como uma ponte para o desenvolvimento. África é rica, mas essa riqueza só se converterá em prosperidade quando o continente conseguir reter e atrair de volta os seus melhores talentos, criando assim um ciclo virtuoso de crescimento, inovação e desenvolvimento sustentável. Cabo Verde, com a sua experiência migratória, pode ser um exemplo a seguir, se souber jogar bem as suas cartas.
*Licenciado em Direito;Técnico de Segurança Pública; Pós-graduando em Direito Penal e Direito Processual Penal militar
Querer Partir e Ter de Ficar: A Nova Tragédia Africana em 12 Atos e um Visto Negado
Meu caro, hoje, o dilema não é já aquele dramalhão poético de “querer ficar e ter de partir”, mas sim o inverso: “querer partir e ter de ficar” — uma ironia trágica que resume bem o sufoco africano moderno. A malta sonha com Paris, Toronto ou Lisboa, mas acorda todas as manhãs em Bissau, Praia ou N'Djamena, enfiada num desemprego crónico e sem Tinder para emigrar. O drama virou comédia amarga: há quem faça fila para fugir, mas sem visto, sem meios e sem padrinho na diáspora, fica-se sentado no cais a ver os barcos partirem — ou, pior, os voos do Instagram. E o mais caricato? Já nem é só o Estado que te prende, é a falta de “sponsorsh ip”. África tornou-se uma prisão sem muros, onde o único bilhete de saída é o desespero… e nem sempre há lugar na piroga.Enquanto Alguns Fogem, Outros Traem
Li esse texto sobre o “êxodo africano” e sinceramente… que desilusão. Mais um a falar da África como se estivesse num seminário em Paris a explicar o continente aos europeus — mas sem coragem de tocar no ponto central: a África continua a ser colonizada, só que agora com luvas brancas e contratos bonitinhos de “cooperação” e “ajuda internacional”.O autor fala do drama das migrações como se os jovens africanos acordassem um dia e dissessem “olha, vou para a Europa só porque sim”. Passa completamente ao lado da realidade: a verdadeira razão por detrás desse êxodo é a traição interna. Um grupo de líderes africanos, sem vergonha nenhuma, continuam a vender os seus países ao melhor comprador estrangeiro. E isso sim, é o verdadeiro crime.
E há exemplos que mostram que é possível fazer diferente. Vejam Ibrahim Traoré, no Burkina Faso. Um jovem líder que teve a coragem de cortar com esse ciclo viciado. Expulsou os interesses franceses e decidiu que o povo burquinabê vinha em primeiro lugar. Claro que isso assusta muita gente, principalmente os que vivem confortáveis a justificar a miséria com discursos de ocasião.
Este tipo de texto que li não é só insensível, é perigoso. Porque perpetua a ideia de que o problema está nos africanos que partem — e não nos sistemas que os obrigam a fugir. E pior ainda: omite deliberadamente os traidores que fingem governar mas na verdade continuam a servir interesses externos.
Meu conselho ao autor? Com todo o respeito: vá estudar, reveja os seus conceitos, e pare de analisar África com as lentes de quem nunca largou o colono que tem dentro de si. A nova geração africana já não tem paciência para este tipo de conversa.
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